Políticas e práticas ou práticas políticas

Manuel Dinis P. Cabeça

Professor do quadro de escola (grupo 400 – História) a exercer funções no Agrupamento de Escolas de Arraiolos

Sou professor dos ensinos básico e secundário com um percurso pós graduado na área da administração educacional e das políticas educativas. Com esta minha situação quero dar conta que sou, à minha maneira, um prático que gosta de teoria (ou o seu inverso, um teórico que gosta da prática, ainda não sei).

Ao ser convidado para escrever um texto de opinião para a página do Fórum Português de Administração Educacional (FPAE) e uma vez que sou docente (e que essa condição tem determinado muito do meu trabalho na área das políticas educativas), o pensamento que me ocorreu foi logo o de relacionar a administração da educação e as práticas docentes. Afinal, qual a forma ou os modos em que um fórum de administração se sente e se repercute no quotidiano escolar e educativo? Qual pode ser o seu objeto ou objetivo na ação local e escolar, no quotidiano das escolas? A partir desta e de outras questões decidi este título que aparenta ser um trocadilho, políticas e práticas ou práticas políticas.

Deste modo e enquanto texto opinativo e com a designação que lhe dei, quero dar destaque a duas ideias.

Uma primeira relativa ao foco das políticas. Foco entendido de forma dinâmica, e não unívoca (pretensamente de cima para baixo, onde uns definem e outros executam). Dinâmica que decorre da sua construção quotidiana, da prática dos atores e, desse modo, fruto de opções do coletivo, pois é assim que entendo o conceito de política (não fosse eu de História).

Uma segunda ideia para defender a necessidade de se assumir uma crescente politização do local e da ação local. Reconheço que pode ser considerada politicamente pouco correta, pois vai em contraciclo ao que muitos afirmam, a despolitização do local e da escola. Nesta medida e como ponto prévio, a necessidade de separar a ideia de política de partidos naquilo que os saxónicos definem como politics, reservado aos partidos e à ação partidária, e policy, no âmbito das opções de governo.

Assim e centrado na ideia da relação entre políticas e práticas, destaco que cada território, cada contexto social dotado da sua cultura, história e tradição, encara, constrói e define os seus problemas. Problemas aqui na perspetiva de serem situações ou condições que interferem e condicionam as suas práticas pedagógicas e, nomeadamente, o sucesso da sua população (alunos mas não só). Se assim é e na plena consideração que as políticas decorrem de práticas sociais e são fruto do conjunto de opções locais, esses mesmos atores deverão ser capazes de identificar, construir e implementar as soluções que consideram mais adequadas aos problemas identificados e ao contexto em que se inserem. Esta ideia remete para a construção local de políticas, para o exercício da autonomia profissional e pedagógica que praticamente muitos defendem e apenas alguns praticam.

Esta mesma situação, de relacionar problemas e soluções, remete não apenas para a capacidade de (re)interpretar e (re)construir normativos, mas e no meu entendimento de forma prioritária, para a capacidade criativa e de mobilização inovadora (porque diferenciadora) de soluções locais perante os problemas identificados. O século XXI requer medidas diferenciadoras, particulares e individuais. Podem ser velhos os problemas enfrentados, mas as soluções terão de ser particulares e adequadas e identificadas por cada contexto e não oriundas de um pronto-a-vestir, seja ele pedagógico ou normativo.

É perante a capacidade de o local assumir as suas opções em processo onde se articulam problemas e soluções, presente e futuros que a administração da educação tem um papel de relevo. De relevo porque destaca o local, os elementos de proximidade e conhecimento dos contextos, como elementos fazedores de opções e de políticas (e não emanada de “espíritos clarividentes” mas exteriores aos contextos sociais e pedagógicos, cognitivos e simbólicos).

Contudo e ainda mais importante que os princípios da administração da educação, o debate local, o envolvimento e partilha coletiva poder-se-á (dever-se-á) estabelecer como fórum local de análise e reflexão. Será com base nesses processos que o Fórum da Administração se pode (deve) tornar centro de diferenciação e aprendizagem, de partilha e formação. Nessa medida, o fórum ao se assumir numa base comunitária, mediante o envolvimento e a participação de múltiplos atores, torna-se o palco privilegiado de análise, reflexão e avaliação das opções localmente assumidas.

Será a partir do cruzamento entre a construção/identificação de opções locais com a partilha e o debate, em regime de fórum de análise e reflexão, que os atores devem assumir a sua vocação política. Vocação por mim entendida na assunção das suas responsabilidades, das suas escolhas, das suas opções. Desse modo, o local, os atores locais, assume a sua dimensão mais política mediante a defesa dos seus interesses, como das suas soluções.

A ideia não é por aí e além inovadora. Passa por os órgãos assumirem as suas dimensões e exercerem as suas funções. Não implica mais trabalho, nem para professores nem para diretores. Implica isso sim, uma outra perspetiva da ação local, o assumir do local enquanto espaço de produção de políticas que são propostas de solução para os problemas aí identificados – e assumirem essas opções. E não apenas o local ser palco de execução de políticas definidas à revelia do contexto.

Não implicará mais reuniões, mas apenas a definição dos espaços, das condições e das regras de discussão, em regime de fórum de parceiros e de reflexão.

Este o meu entendimento sobre o que um Fórum de Administração Educacional pode (deve) representar no seu cruzamento entre práticas e políticas e fazer das políticas uma questão prática, porque próxima das pessoas.

Download do texto de opinião.

Nota: A opinião aqui expressa é da inteira responsabilidade do(s) seu(s) autor(es).